Encarando os fatos. A imagem do Brasil está diretamente associada as favelas. Por mais que nossos cartões postais tentem negar, a imagem do rapaz negro, magro, sem camisa, chinelos havaianas e uma camisa no rosto ganhou há tempos um papel estereotipado ligado a venda de drogas nas favelas. Procuro aqui dissociar a palavra tráfico com o que acontece nas favelas, pois é bom lembrar que sobre os que caem toda a punição legal e ilegal (execuções) associada a venda de drogas, não tem nenhum contato, ou quase nenhum, com as formas de entrada das mesmas na favela, a droga vem de fora, bem como as armas. O que acontece na favela é o mesmo que acontece na vendinha da esquina da sua casa com produtos de primeira necessidade, nada é produzido na vendinha, é um mero ponto de venda, igualzinho o ponto de venda de drogas nas faculdades, exatamente a mesma coisa que o playboy faz na universidade.
A questão é que esse imaginário da camisa no rosto se tornou simbolo de marginalidade (os que estão a margem da sociedade), e hoje a mídia usa isso para associar covardemente ao uso de máscaras em manifestações. Nas favelas, que o periódico diário eufemiza chamando de comunidade, o rosto coberto já não é mais comum. O traficante aparece de cara limpa e fuzil no peito em frente as câmeras de qualquer agência de notícia. Mas a mídia fez o banquete com as imagens dos manifestantes com rostos cobertos. Claro, a mídia faz parte do esquema e, inclusive, é uma das criticadas pelos manifestantes, faz todo sentido do mundo ela querer criminalizar manifestantes e minguar protestos. Mas e os manifestantes, porque permanecem escondendo os rostos?
Existem duas questões; prática e simbólica. Ambas já foram abordadas exaustivamente aqui, mas vamos falar novamente. O Estado não tem interesse em ver mudanças sociais, se tivesse interessado já teria feito há muito tempo, mas não faz. Então todo aquele que pensa em mudanças e estimula essas mudanças sociais visando o bem coletivo automaticamente é taxado de inimigo do Estado. Ameaça os poderosos e suas benesses. Naturalmente eles reagirão. Naturalmente eles criminalizaram aqueles que querem essas mudanças. Naturalmente eles os perseguirão. E a função prática do rosto coberto é essa, se proteger do Estado que oprime e caça seus dissidentes.
Na função simbólica temos a ausência do ego, a ausência do eu. Somos todos nós, unos em meio a multidão. Não importa se essa multidão é no Rio de Janeiro, São Paulo, Egito, México. É a mesma multidão sem rosto e oprimida pelo mesmo sistema global assassino, sanguessuga de todos nós. Somos todos os mesmos ao redor do globo na mesma luta contra a mesma mão invisível que nos cala a boca e tenta nos tomar o sopro divino de vida. Por tudo isso nos mascaramos, em verdade até mais pela função simbólica que pela prática. Lutamos por todos, por sermos todos, por sermos um.
fonte: Anonymous Rio
Luto minhas próprias lutas, de cara limpa, não preciso de máscara. E não outorguei procuração para representação legal, muito menos por grupos que não conheço e nem reconheço devido às máscaras. Sem falar que discordo da pauta, se não vê as mudanças que estão sendo promovidas nos últimos 20 anos é ignorante ou conivente com aqueles que não as querem.
Tudo bem, se você quer se manifestar mostrando o rosto, é um direito seu. Mas não é justo criminalizar quem pensa de forma diferente e opta por participar de manifestação usando uma máscara, que é geralmente usada como um símbolo, como uma identificação entre as pessoas que participam, sinalizando que compartilham das mesmas ideias e ideais.
Você pode discordar da pauta e pode achar que o país está uma maravilha, é um direito seu. Mas também deve reconhecer o direito a quem pensa diferente de dizer que quer mais mudanças, que o que foi feito pode ser importante, e é, mas podemos avançar muito mais. Ou não podemos?