- Por Tatiana de Mello Dias
A pirataria pode fazer a indústria perder dinheiro, mas o combate contra ela pode custar ainda mais caro. A França, um dos primeiros países a adotar uma lei dura de combate à pirataria, a Hadopi, está contabilizando o gasto dos dois anos de endurecimento da legislação. E a avaliação da nova ministra da Cultura, Aurélie Filippett, é clara: a lei é “restrita, antieconômica e, finalmente, ineficaz”.
Abreviação para Haute Autorité pour la Diffusion des Oeuvres et la Protection des Droits sur Internet (alta autoridade pela difusão das obras e a proteção dos direitos na internet, em francês), a lei que entrou em vigor em 2010 determina que os provedores identifiquem os piratas para que o governo aplique penas progressivas. Primeiro, um e-mail de advertência; depois, uma carta; por último, multa e suspensão da internet. Se alguém baixasse algo ilegalmente na sua casa, você poderia ter sua internet cortada, mesmo pagando por ela.
Aos números: em dois anos, foram enviados um milhão de e-mails, 99 mil cartas foram registradas, 134 quatro usuários chegaram a ser investigados, mas ninguém – nenhum usuário da internet da França – teve a conexão suspensa. O sistema já custou US$ 14,7 milhões. A questão é simples: por que o governo está gastando tanto dinheiro para monitorar algo de interesse privado?
As empresas comemoraram a legislação. E tinham números para mostrar: a lei cortou pela metade os downloads ilegais e houve uma queda de 29% nas visitas a sites piratas em 2011. Só que a indústria cultural francesa continuou amargando a queda que, dizia, era provocada pela pirataria. As gravadoras registraram 3,9% de prejuízo naquele ano; a indústria do cinema, 2,7%, Além disso, um estudo lançado logo que a lei entrou em vigor mostrou que os usuários estavam usando mais sites de download direto, como Megaupload, em substituição a sites de P2P, facilmente enquadrados pelos provedores como pirataria.
Para a ministra Aurélie Filippett, a lei Hadopi falhou em um ponto fundamental: ela não incentiva novos modelos de negócio. “Ela não cumpriu sua missão de estimular os downloads legais”, disse a ministra. “Em termos financeiros, são 12 milhões de euros por ano e 60 funcionários. É caro demais para apenas enviar e-mails.” Aurélie disse que prefere cortar as verbas de coisas cuja utilidade não é provada – caso da Hadopi.
A Eletronic Frontier Foundation, entidade californiana que luta por liberdade na web, aplaudiu a decisão. “A lei na França é contrária aos princípios de inovação e liberdade de expressão, e ainda serviu de modelo para uma legislação parecida em países como Nova Zelândia, Reino Unido e Coreia do Sul”, comunicou a entidade.
O governo norte-americano também estuda uma aliança entre indústria e provedores para aprovar uma lei do tipo nos EUA – e a recomendação é que outros países sigam a cartilha. Com o recuo da França, porém, é possível que o modelo de repressão pura e simples comece a ser revisto no mundo.
fonte: Blog Estadão