Roubaram nossa internet

Nos últimos dias li notícias que, infelizmente, me deixaram ainda mais preocupado com relação ao futuro imediato da internet. Sim, futuro imediato, para daqui a um, dois anos apenas!

A primeira notícia é sobre a expansão do Facebook, notícia publicada no Gizmodo e reproduzida aqui no Nerdices. De 137 países pesquisados, em 127 o Facebook é a rede social dominante. O alarmante é que há três anos atrás a rede mal conseguia dominar um continente inteiro e praticamente inexistia em países asiáticos. Vejam como está hoje a expansão do Facebook (se fosse War, eu já teria entregado os pontos pro exército azul!):

O simples fato de uma única empresa monopolizar desta forma o que chamamos de redes sociais já é em si extremamente problemático. Mas no caso do Facebook é ainda mais grave, pois sabemos, graças à coragem do ex-agente da CIA Edward Snowden, que o Facebook é monitorado pelas agências de segurança dos Estados Unidos e entrega as informações de seus usuários quando solicitado.

A outra notícia que me preocupou também, em um grau semelhante à primeira notícia, é sobre a queda dos servidores do Google por dois minutos no último dia 16 de agosto. Esta queda de apenas dois minutos teria reduzido o tráfego da internet em 40%.

Isso mostra que, não de forma tão explícita quanto o Facebook, que aparece para nós usuários como apenas “um lugar”, o Google, com seus “muitos lugares” e serviços pulverizados – GMail, Blogspot, You Tube, Picasa, Maps, Play e mais de uma dezena de outros – também tem um grande monopólio da internet.

Me arrisco a dizer que Facebook e Google detém, atualmente, mais de 80% do tráfego da internet. Ou seja, a ciberpopulação está refém de apenas duas empresas! E duas empresas que estão colaborando ativamente com o governo dos Estados Unidos no combate ao que eles acham que deve ser combatido – e que certamente não é o mesmo que nós achamos!

A internet foi, durante quase toda sua existência, uma rede plural, dinâmica, onde ideias surgiam, se misturavam e davam origem à novas ideias. Havia, pra dar apenas um exemplo, uma pluralidade de programas para nos comunicarmos – quem lembra do ICQ, do Odigo, do Yahoo Messenger, do MSN, do AIM da AOL, além de chats e do mIRC?

Da mesma forma, para pesquisar tínhamos o Altavista, o Cadê, o Yahoo e muitos outros mais. Hoje, apenas o Google.

Para navegar tínhamos o Netscape, Opera, Explorer. Hoje, cada vez mais o Chrome se consolida.

Todos estes programas sumiram, sucumbiram com o monopólio do Facebook e seu messenger. Nem mesmo a Microsoft conseguiu resistir e terminou com o seu MSN, além de ver seu Explorer agonizar.

Hoje, quase toda a nossa navegação está comprometida. Nos tornamos prisioneiros do Facebook e do Google. Eles nos dizem o que podemos ver, e censuram o que entendem que não é interessante para nosso consumo.

De outro lado, temos as empresas de telecomunicações aqui no Brasil gestionando junto ao governo a quebra da neutralidade, que irá tornar a internet um negócio ainda mais lucrativo do que já é, fragmentando todos os seus serviços e cobrando valores diferenciados por isso. A respeito disso, também publicamos aqui no Nerdices um excelente artigo.

O quadro é alarmante. E tende a piorar. Os ativistas da liberdade na rede, os ativistas dos direitos civis, do movimento do software livre, dos movimentos sociais mais tradicionais, precisam articular urgentemente novas formas e ferramentas para garantir nossa privacidade, nossa liberdade de navegação e de escolha de conteúdo, Inclusive pensar em construir, por que não, novas redes sociais. Pois essas restrições que estão sendo impostas à internet, logo, logo, se farão sentir no dia-a-dia de todos nós.

Não é possível existir uma sociedade livre e democrática sem uma rede livre e democrática. Vamos agir, ou esperar que nos enjaulem definitivamente?

Wladimir Crippa, editor do Nerdices e da Coordenação Nacional do Partido Pirata

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Posted by Wladimir

Nerd desde sempre. Começou a programar em Basic, em um CP 400 Color II lá por 1985. Fã de Star Wars, Star Trek e outras séries espaciais. Pai de 4 filhos - um era pra se chamar Linus, mas o nome encontrou muita resistência :( Aliás, software livre é outra paixão. Usuário Linux desde 1999. Presidente da Associação Software Livre Santa Catarina. Defensor do livre compartilhamento. É o compartilhamento que tem feito a humanidade avançar. As ideias são uma construção coletiva da humanidade :) Foi fundador do Partido Pirata do Brasil e membro de sua 1ª Executiva Nacional (2012-2014). Foi também assessor do gabinete do Ministro da Ciência e Tecnologia durante 2016, até a efetivação do golpe que destituiu Dilma Rousseff. Ah, também é editor aqui dessa bagaça, onde, aliás, você também pode colaborar. Só entrar em contato (42@nerdices.com.br) e enviar suas dicas, artigos, notícias etc. Afinal, a Força somos nós!

Website: http://www.nerdices.com.br

This article has 15 Comments

  1. Não se preocupe com a massa! Antigamente quem estava na Internet eram os geeks enquanto a massa assistia TV… Hoje a massa está nas Internet e só migrou da TV para o Facebook…

  2. Ativistas de Software Livre? Pode esquecer. Vários ativistas de software livre no Brasil foram trabalhar para o Facebook, Google, IBM e outras grandes empresas “do mal”. Os que ainda estão no Brasil ocupam cargos de nomes curiosos com “Gerente de comunidades” ou coisa que o valha. O FATO é que as comunidades de software livre foram tomadas e são controladas por grandes empresas hoje. E quem denuncia esse tipo de golpe é taxado de xiita e encrenqueiro, além de ser discriminado por certas “comunidades” que não querem se indispor com os donos do Software Livre no Brasil. As comunidades genuinas são pequenas e fracas, não têm apoio de grandes empresas, nem do governo. É triste, mas é a mais pura verdade.

    1. Paulo, eu até concordo que vários dos chamados “ativistas do software livre” bandearam pro outro lado ou se isolaram em suas torres de marfim. Mas convém não generalizar.

      Mesmo porque a única saída viável pra essa armadilha está justamente no SL. E já temos alternativas viáveis às grandes redes corporativas. Existem várijunto com mídias sociais livres, inclusive uma desenvolvida aqui no Brasil, que é a Noosfero.

      Mas eu prefiro mesmo as mídias distribuídas, ou seja, aquelas em que, ao invés de se cadastrar em um lugar só, cada um (ou cada grupo) instala sua própria instância e os softwares conversam entre si. O exemplo que ficou mais famoso foi a Diaspora, mas eu gosto mais da ~friendica e da red matrix. Inclusive mantenho (junto com o Sérgio Lima) um nó da red# aberto ao público. O endereço desse nós é http://red.vilarejo.pro.br

      Tá vendo como ativistas podem ajudar a resolver a situação? 😉

  3. Pelo que vejo depois desse tempo todo na net você ta muito inocente. Esperar um ex-agente da CIA dizer que o EUA monitora as redes sociais nem de longe é novidade pra mim é como dizer que a TIM tem acesso as minha conversas. O Snowden vazou uma noticia que todo mundo já sabia, quem não sabia iria ficar sabendo ou pela CIA ou por um Hacker Anonimo. Melhor pela CIA, melhor pra eles. Alguém conhece a história do Cavalo de Troia!? será que o Snowden não é um agente duplo? Nem de longe eu acredito nesse cara…

    1. Alan, suspeitar, eu e creio que todo mundo que conhece um pouco de tecnologia já suspeitava. A novidade, no caso, é que dessa vez foi alguém lá de dentro, no caso o ex-agente da CIA, quem confirmou, com provas, as suspeitas que todos já tínhamos. E isso muda muito a situação, tanto que antes você não via a imprensa falar nesse assunto – e nós, ativistas, movimentos, Anonymous, partidos piratas – já falávamos. A partir do caso Snowden, o assunto virou pauta obrigatória da imprensa e inclusive de campanhas eleitorais.

  4. Simples questão cíclica. O ICQ dominou em sua época, o AltaVista em sua época, o IE em sua época e o Orkut em sua época.

    Resumindo, nada mudou ao longo dos 20 anos de Internet comercial. Mudam-se os players somente.

    Daqui há pouco vem outro e ocupa o lugar. Simples assim.

    1. Não concordo Paulino, eu vivi esses anos e havia concorrência. O ICQ não reinava sozinho, havia o Odigo, havia o messenger do Yahoo, da AOL, havia até o MSN que recém nascia. E que dominou depois porque a Microsoft usou sua tática monopolista que matou o ICQ e os demais messengers como matou o Netscape e impôs o Internet Explorer. O que só comprova o meu temor: o monopólio é prejudicial à liberdade na rede. É preciso criar formas de impedi-lo e é preciso estimular a liberdade na rede.

  5. Acho que o caminho para novos codigos está aberto.

    Muito inocente alguem acreditar que algo como a internet não seria espionada.

    OK menos o google, que descobre suas preferencias por magica
    Ou o auto preenchedores, que guardam seus dados, prometem manter privacidade ¬¬

  6. Ainda existem opções para quem deseja privacidade ao navegar na internet. O navegador Tor, o motor de busca DuckDuckGo e outros.

  7. O google ou facebook te obriga a usar seus serviços? Ou eles ganharam na excelência dos seus produtos?

    Acredito que muito desse fuzuê todo é espalhado pelas antigas empresas que dominavam o mercado e agora estão perdendo ele e ficam acusando seus concorrentes de coisas que eles faziam muito pior.

    Microsoft é mestre de fazer isso. Todos seus produtos te travavam a seus serviços e processavam e processam até hoje todos seus concorrentes para manter seu monopólio ao invés de ganhar o mercado por mérito de seus produtos.

    Pelo menos essas novas empresas como Facebook e Google não agem de modo desleal no mercado e ganham seus clientes pela qualidade.

    Além que eles incentivam uma internet muito mais aberta que outras empresas como a Microsoft ou Apple.

    E tem vários projetos Open Source de peso. Ao contrário dos antigos dinossauros.

    1. Não me parece muito legal repassar as informações de seus usuários para órgãos de segurança…

      Quando me registrei no Google e no Facebook, não me informaram que eu estaria sujeito a isso.

      Talvez até estivesse nas letrinhas miúdas… mas não imagino que alguém use estes serviços achando que seus dados serão repassados dessa forma.

      Todos esperamos um mínimo de privacidade e respeito. Eu espero pelo menos.

  8. Nos anos 90, você fazia uma pesquisa no google e ele retornava todo tipo de sites, institucionais, empresas, pessoais, sites toscos, enfim, a internet era um lugar de todos. Dependendo da sua expressão de busca, poderia trazer tudo o que quisesse.
    Hoje, graças ao google, a internet é um ambiente corporativo, onde só há lugar para grandes projetos/empresas. São sempre os mesmos tipos de sites, sempre com caráter de “oficial”. As páginas diversificadas, fora do padrão empresarial, ficam muito distantes… Vejo que a internet hoje é pobre (e até chata) não se compara com o que era ou poderia ser.

  9. não acho que eles “roubaram a internet”, acho que somente estão na sua “fase modinha” da mesma forma que era com o MSN e Orkut. E também não precisa ser muito esperto pra saber que você é vigiado na internet e de certa forma não estão errados. Com todos esses “olhares” em cima de nós existem centenas de sites considerados ilegais e quem quer viver no anonimato, digamos assim, usam o navegador Tor que foi programado exatamente para isso.

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